A prevenção do consumo de álcool entre adolescentes é um tema de grande relevância para a saúde pública, uma vez que este consumo precoce está associado a uma série de complicações à saúde e à exposição a riscos como prática de sexo desprotegido, gravidez precoce, mortes por acidentes, queda no desempenho escolar e aumento no risco de dependência de álcool em idade adulta. [Saiba mais em Juventude e Álcool: cenário atual]
Estudos têm buscado avaliar a eficácia de diferentes programas de prevenção em escolas, buscando identificar as abordagens mais eficazes para reduzir e/ou evitar a iniciação do consumo de álcool em adolescentes. No Brasil, por exemplo, programas como o Unplugged (conhecido no país como #Tamojunto) demonstraram impacto positivo. Este programa, composto por 12 aulas para alunos da 7ª e 8ª séries, foca no desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Um estudo realizado em 73 escolas públicas no Brasil mostrou que, embora o programa não tenha prevenido o beber pesado episódico (BPE), teve um importante impacto na redução da experimentação de álcool1.
Nesse sentido, um estudo realizado na Austrália avaliou a eficácia do programa de prevenção seletiva, baseado em traços de personalidade, sobre o consumo de álcool em adolescentes2. O programa, denominado PreVenture, é um método que tem como iniciativa reduzir comportamentos de risco em jovens e adolescentes, incluindo o uso nocivo de álcool e outras substâncias. O método utiliza uma abordagem baseada em evidências para identificar fatores que tornam os jovens mais vulneráveis a comportamentos de risco, identificando traços de personalidade que podem estar associados a comportamentos como impulsividade, sensibilidade à ansiedade, pensamentos negativos e busca por sensações.
O estudo, um ensaio clínico randomizado em clusters, foi realizado em 14 escolas secundárias de New South Wales e Victoria, na Austrália, em 2012. Os participantes eram estudantes do 8º ano, com média de 13,4 anos de idade, que apresentaram altos níveis de pelo menos um dos traços de personalidade mencionados acima. As escolas foram randomizadas em dois grupos (PreVenture e controle) e o seguimento inicial do estudo foi realizado por até 2 anos, com uma extensão do acompanhamento de até 7 anos (2017-2019).
A intervenção consistiu em duas sessões focadas em ensinar habilidades para que os adolescentes pudessem lidar melhor com suas emoções e comportamentos. Foram medidos o consumo excessivo de álcool mensal (binge drinking), danos relacionados ao consumo e uso perigoso de álcool, medido através do AUDIT-C.
Dos 438 alunos inicialmente incluídos no estudo, 377 (86,2%) forneceram dados de acompanhamento em pelo menos duas ocasiões, e 216 (54%) participaram no seguimento de longo prazo. O grupo PreVenture apresentou uma redução significativa nas chances de qualquer dano relacionado ao álcool e uma redução média na frequência de danos após os 7 anos de acompanhamento. Além disso, os resultados mostraram uma redução nas chances de binge drinking e uso nocivo de álcool no acompanhamento de 5,5 anos, porém esses efeitos não foram sustentados no seguimento de 7 anos.
Apesar dos resultados positivos, o estudo apresenta algumas limitações como uma amostra relativamente pequena (438 participantes) e a diminuição da amostra ao longo do seguimento (apenas 54% dos participantes completaram os 7 anos), além da ausência de sessões de reforço, ou seja, o programa consistiu em apenas duas sessões iniciais, sem intervenções adicionais ao longo do tempo.
No entanto, o estudo demonstrou que uma intervenção breve e seletiva, direcionada por traços de personalidade, aplicada durante a adolescência, pode ter efeitos sustentados no consumo de álcool até o início da vida adulta. E embora a redução de danos relacionados ao álcool tenha persistido por 7 anos, os impactos sobre o consumo excessivo mensal e o uso perigoso de álcool foram mais limitados a médio prazo. Esses resultados reforçam a importância de intervenções precoces, especialmente durante os anos escolares, para mitigar os impactos do consumo de álcool. No entanto, ele também alerta para a necessidade de estratégias de longo prazo, como a implementação de sessões de reforço, para sustentar os efeitos no consumo excessivo de álcool.
